Assim vamos nós, nesta "apagada e vil tristeza", que os sucessivos
desgovernos se esforçam por transformer em conquistas douradas, em terras
prometidas, em expoentes de eficiência, em caminhos de futuro, de
desenvolvimento sustentado, de aproveitamento racional e cientifico dos
recursos. Tudo do que há de melhor em governos. Tudo para o bem comum, em
especial, para o bem de alguns poucos, pois que a gamela não é grande.
Lembro-me - Oh! Se me lembro!, infelizmente! - do tempo de Salazar, quando
vivendo no mais perfeito obscurantismo medieval, as valhotas diziam que o
"Botas" era o melhor estadista do Mundo. Não faziam a coisa por menos.
Pois os seus herdeiros sucial-nacionalistas,também são sempre os melhores.
Pelo menos,não renegam a origem das ideias que lhes servem de padrão. Com os
seus companheiros de alternância, alternam na cupidez, na ganância, na
corrupção. São empregados de café dos grandes senhores, ministros do reino
por vontades estranhas, com a aquiescência e beneplácito de um povo acrítico
e ignorante.
Uma familiar minha, pessoa muito arguta e muito inteligente dizia, há dias,
que perante o que se passa, só lhe apetecia emigrar. A mim, também.
Já estou velho para tal e, para maior desgraça, gosto do canto onde nasci.
Por meu mal, parece-me que não vou poder nunca deixar de manifestar a
insatisfação que me invade quando vejo tanta mentira e desprezo por parte
daqueles que se intitulam donos do poder.
Porra, já chega!
Antes de terminar, um esclarecimento e um poema de Torga.
O esclarecimento: escrevi acima "Sucial" com u, e não se tratou de uma
gralha.
Quanto ao poema, aí vai:
DIES IRAE
Apetece cantar, mas ninguém canta,
Apetece chorar, mas ninguém chora,
Um fantasma levanta~
A mão do medo sobre a nossa hora.
Apetece gritar, mas ninguém grita.
Apetece fugir, mas ninguém foge.
Um fantasma limita
Todo o futuro a este dia de hoje.
Apetece morrer, mas ninguém morre.
Apetece matar, mas ninguém mata.
Um fantasma percorre
Os motins onde a alma se arrebata.
Oh! Maldição do tempo em que vivemos,
Sepultura de grades cinzeladas,
Que deixam ver a vida que não temos
E as angústias paradas!
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